Apresentamos à comunidade, a nossa nova tese sobre atividades concomitantes (pessoa que trabalha em duas ou mais atividades ao mesmo tempo e recolhe contribuições previdenciárias em cada uma delas), na qual concluímos que o justo é a soma dos recolhimentos concorrentes.
Todos os trabalhadores que exerceram duas ou mais atividades simultaneamente (ao mesmo tempo) e já estão aposentados poderão pedir a revisão dos seus benefícios com base neste artigo jurídico.
Atividades Concomitantes - Art. 32 da Lei 8.213/91
O art. 32 da
Lei 8.213/91 traz regulamentação acerca da forma de cálculo do
salário-de-benefício daquele segurado que verteu contribuições em face do
exercício de mais de uma atividade laboral abrangida pelo RGPS num mesmo
período, o que comumente se denominou de “atividades concomitantes”.
O dispositivo
não se modificou ao longo do tempo, sendo mantida a redação originária prevista
na Lei 8.213/91, assim composta:
Art. 32. O salário-de-benefício do
segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com
base na soma dos salários-de-contribuição das atividades exercidas na data do
requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto
no art. 29 e as normas seguintes:
I - quando o segurado satisfizer, em
relação a cada atividade, as condições do benefício requerido, o
salário-de-beneficio será calculado com base na soma dos respectivos
salários-de-contribuição;
II - quando não se verificar a hipótese
do inciso anterior, o salário-de-benefício corresponde à soma das seguintes
parcelas:
a) o salário-de-benefício calculado com
base nos salários-de-contribuição das atividades em relação às quais são
atendidas as condições do benefício requerido;
b) um percentual da média do salário-de-contribuição
de cada uma das demais atividades, equivalente à relação entre o número de
meses completo de contribuição e os do período de carência do benefício
requerido;
III - quando se tratar de benefício por
tempo de serviço, o percentual da alínea "b" do inciso II será o
resultante da relação entre os anos completos de atividade e o número de anos
de serviço considerado para a concessão do benefício.
§ 1º O disposto neste artigo não se
aplica ao segurado que, em obediência ao limite máximo do salário-de-contribuição,
contribuiu apenas por uma das atividades concomitantes.
§ 2º Não se aplica o disposto neste
artigo ao segurado que tenha sofrido redução do salário-de-contribuição das
atividades concomitantes em respeito ao limite máximo desse salário.
E sua
introdução no sistema previdenciário buscou coibir manobras dos segurados à
beira da aposentação que, diante da inexistência de regramento similar antes da
vigência da atual Lei de Benefícios (Lei 8.213/91), deliberadamente realizavam
contribuições em altos valores com o fim específico de aumentar a renda do
benefício previdenciário.
Isso porque,
antes das modificações introduzidas pela Lei 9.876/99, que alteraram
substancialmente a forma de apuração da renda mensal, em especial dando nova
redação ao caput do art. 29 e acrescendo os incisos I e II, o
salário-de-benefício era calculado com base nas últimas trinta e seis
contribuições da vida laborativa do trabalhador.
Porém,
conquanto o legislador tenha colimado a proteção e manutenção longeva do
sistema previdenciário, reputo que a disciplina dada ao tema é falha, eis que,
além de complexo, o regramento não se revela claro, objetivo e preciso,
resultando numa aplicação casuística que impõe um tratamento desigual aos
segurados em situações idênticas ou assemelhadas. E, no meu modo de ver, tal
situação conduz à inconstitucionalidade do art. 32 por infração direta aos
princípios da isonomia e da contributividade.
Com efeito,
hipoteticamente, se compararmos um segurado empregado que realiza uma única
atividade e verte uma única contribuição com outro segurado empregado que
mantém dois contratos de trabalho ao mesmo tempo, mas as suas duas
contribuições consolidam valor idêntico ao do primeiro, qual seria o motivo de
serem tratados de forma diversa na composição de suas rendas, uma vez que não
há nenhuma diferenciação entre os valores vertidos ao RGPS? Penso que não há
razão nenhuma para este tratamento desigual, porquanto ambos contribuíram
igualmente para o RGPS em face da filiação obrigatória.
E o fato de o
segundo segurado empregado realizar duas contribuições distintas também não
descaracterizaria sua condição ou direitos perante o RGPS, eis que, no final
das contas, a contribuição efetiva seria idêntica ao do primeiro.
Desta forma,
não se justifica a incidência da precária regulamentação do art. 32 da Lei
8.213/91 nos casos de atividades concomitantes, sob pena de se impor injustiça
aos segurados que ostentam idênticas condições de contribuição ao INSS.
Aliás, em face
do caráter compulsório de filiação e de contribuição ao RGPS, em princípio, a
concomitância no labor e, por consequência de mais de uma contribuição por um
único segurado, deveria receber tratamento diferenciado, incentivado de forma
justa o trabalhador que, cada vez mais, se vê impelido ao exercício de duas ou
mais atividades laborais para prover o seu próprio sustento e de sua família.
Isso independentemente se as múltiplas jornadas de trabalho se estenderam por
todo o tempo necessário para a obtenção do benefício ou apenas por algum tempo.
O tratamento
casuístico e, portanto, não isonômico também se revela nas entrelinhas da
complexa e incompleta estrutura normativa contida no art. 32.
A hipótese
prevista no caput c/c com o inciso I não enseja maiores
digressões, pois estabelece o simples somatório dos salários-de-contribuição
das diversas atividades concomitantes na apuração do salário-de-benefício,
quando o segurado implementa os requisitos legais de gozo do benefício
previdenciário em relação a cada uma delas.
Porém, quando
o segurado não satisfaz os requisitos legais para o benefício previdenciário em
relação a todas atividades desempenhadas em concorrência, a lei dá disciplina
diversa, cuja aplicação ao estrito entendimento do ente previdenciário tem
ensejado discussões acerca das possíveis revisões no cálculo do
salário-de-benefício e, consequentemente, da renda mensal.
Explico.
Num primeiro
momento, o INSS desmembra as atividades concomitantes em dois conjuntos. O
primeiro, denominado de “atividades principais”, é composto pelas atividades em
que o segurado implementou todos os requisitos legais ao benefício. O segundo,
chamado de “atividades secundárias”, por exclusão, compõe-se daqueles em que
algum dos requisitos de gozo não restou observado. E se o segurado não
consolidou os requisitos de aposentação em nenhuma das atividades, de praxe, o
INSS considera “atividade principal” aquela que constitui um tempo maior de
contribuição, ou seja, a de maior duração.
Neste aspecto,
já se observa a conduta irrazoável do INSS, pois não é cabível a eleição
subjetiva e unilateral de regras de cálculo, ainda que pelo ente
previdenciário, pois não há definição legal do que seja “atividade principal”,
nem das atividades que podem ser consideradas tal.
Ora, para fins
de enquadramento, em face da ausência da expressa definição legal, o
dispositivo em comento deveria ser interpretado e aplicado em favor do
segurado, considerando-se
como "principal" a atividade desempenhada da qual resulte maior
proveito econômico, sob pena de se impor ao segurado a preterição do seu
direito sem
a devida previsão legal para tanto. Aqui, reside o respeito à
relação bilateral previdenciária, observando-se o chamado princípio
constitucional da contributividade.
Ao tentar dar
efetividade ao art. 32 da Lei 8.213/91, o INSS também tem manejado
incorretamente a apuração do salário-de-benefício à luz do inciso II, alíneas
“a” e “b”.
De acordo com
aquelas disposições, ao se delimitar qual a atividade principal e quais as
secundárias, apurar-se-ia o salário-de-benefício daquela (“a”), para que fosse
somado a um percentual da média do salário-de-contribuição de cada uma destas
(“b”), que seria equivalente à razão entre os meses de contribuição e do
período de carência do respectivo benefício.
Mas, embora a
alínea “b” do inciso II não tenha feito referência a salários-de-benefício das atividades secundárias, mas sim à
uma média dos salários-de-contribuição, no desenrolar destas duas fases do
cálculo, em tese, o INSS tem apurado um salário-de-benefício para a atividade
principal e, também, um para cada atividade secundária, mas utilizando fatores
previdenciários distintos.
Assim, outra
celeuma se verifica concentrada na possibilidade de ser utilizado mais de um
salário-de-benefício, mediante a incidência de diferentes fatores
previdenciários para as contribuições vertida em cada uma das atividades, seja
principal, seja secundária.
Quanto ao
fator previdenciário, é oportuno considerar que tem como escopo "estimular a permanência dos
segurados na ativa", sendo um "deflator no valor do benefício apurado
com base no período básico de cálculo já estendido", a fim de
"penalizar o trabalhador que, tendo os 30 ou 35 anos de contribuição ou de
serviço, adquira o direito em 'tenra' idade" (Simone Barbisan Fortes e Leandro
Paulsen. Direito da Seguridade Social, Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2005, p. 235).
Logo, este
critério de limitação da renda centra-se na idade do segurado e visa impedir a
aposentação precoce, estabelecendo, por outro lado, o equilíbrio atuarial do
sistema.
Ao se
considerar essa premissa, tem-se que o fator previdenciário, ainda que diante
de atividades concomitantes, deve incidir uma única vez, apenas após a soma das
parcelas referentes à atividade principal e secundária, tendo por base o total
de tempo de serviço do segurado, e não apenas aquele no qual a respectiva
atividade restou realizada.
Note-se que,
em nenhum momento, o art. 32 deu autonomia ao INSS para fazer incidir o fator
previdenciário de forma independente quanto à cada atividade, principal ou
secundária. E não poderia ser diferente, pois, consoante já exposto, se trata
de um redutor que tem como foco a idade do segurado no momento da
aposentadoria, e não o tempo de contribuição.
Esta situação
ainda é corroborada quando o aludido dispositivo não determina a apuração de
"salários-de-benefício" das atividades secundárias, fazendo menção
única e exclusivamente a uma apuração proporcional que denominou de "média
dos salários-de-contribuição".
Vale também
observar que a proporção incorporada nessa média das atividades secundárias já
consolida uma fórmula redutora que impõe minoração na renda final, porquanto
observa o número de anos de contribuição/serviço em cada uma das respectivas
atividades.
Portanto, ao
se admitir a incidência de diversos e independentes fatores previdenciários
considerando os tempos de contribuição em cada atividade, novamente se
penalizaria duplamente o segurado, pois o resultado disso tornaria irrisórios
os salários-de-benefício das atividades secundárias e infringiria, por
consequência, a isonomia entre os segurados que se revela na garantia de
justiça àquele trabalhador que exerce duas ou mais atividades laborais ao mesmo
tempo e, em tese, contribui ao RGPS de forma idêntica ou até mais que outros
trabalhadores com uma única atividade.
Também não se
mostra viável, nem razoável, a apuração de um salário-de-benefício para a
atividade principal e de outros para as atividades secundárias, utilizando-se
um único fator previdenciário. Isso porque os salários-de-benefícios das
atividades com menor lapso de contribuições culminariam em médias superiores
àqueles apurados sob um número maior de contribuições, beneficiando, casuística
e indevidamente, o segurado.
Diante dessas
razões, entendo que a aplicação do art. 32 e seus incisos não se faz viável no
atual sistema previdenciário, em especial pela infração ao princípio da
igualdade que é gerada na sua incidência casuística.
Portanto,
para se preservar o tratamento isonômico entre os segurados, na hipótese da
coexistência de contribuições vertidas pelo exercício de mais de uma atividade
laboral, o cálculo da renda mensal deverá ser realizado seguindo-se os
seguintes parâmetros:
a) o
período básico de cálculo será composto segundo o disposto no art. 29, I, da
Lei 8.213/91 c/c art. 3º da Lei 9.876/99, vale dizer, no cálculo do
salário-de-benefício, será considerada a média aritmética simples dos maiores
salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de
todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994;
b) nas
competências do PBC em que houver recolhimentos concorrentes, os respectivos
salários-de-contribuição deverão ser somados, independentemente se relativos à
atividade principal ou às atividades secundárias, respeitado o teto de
contribuição;
c) a
renda mensal decorrerá de um único salário-de-benefício, sobre o qual
incidirá uma única vez o fator previdenciário;
d) o
fator previdenciário será calculado na forma do §7º do art. 29 da Lei 8.213/91,
levando-se em conta o tempo de contribuição até o momento da aposentadoria.
Por fim, anoto
que a egrégia Turma Nacional de Uniformização de jurisprudência dos Juizados
Especiais Federais, invocando motivação diversa da acima exposta, recentemente
modificou o seu entendimento acerca da matéria, para declarar derrogado o art. 32 pelos art.
9º e 14 da MP 83/2002, convertida na Lei 10.666/2003, deixando de produzir
efeitos a partir de 01/04/2003. Confira-se
a conclusão do voto do eminente relator Juiz Federal João Batista Lazzari,
proferido nos autos PEDILEF 5007723-54.2011.404.7112, in verbis:
(...) 10. Dessa forma, o art. 32 da Lei
n. 8.213/91 deixou de ter vigência a partir de 01/04/2003, pois, com a extinção
da escala de salário-base (arts. 9º e 14 da MP 83/2002, convertida na Lei n.
10.666/2003), a regra deixou de produzir o efeito pretendido, tendo ocorrido
sua derrogação, motivo pelo qual proponho a uniformização do
entendimento de que:
a) tendo o segurado que contribuiu em
razão de atividades concomitantes
implementado os requisitos ao benefício em
data posterior a 01/04/2003, os salários-de-contribuição concomitantes
(anteriores e posteriores a 04/2003) serão somados e limitados ao teto;
e b) no caso de segurado que tenha
preenchido os requisitos e requerido o benefício até 01/04/2003, aplica-se o art. 32 da Lei n.
8.213/1991, observando-se que se o requerente não satisfizer, em relação a cada
atividade, as condições do benefício requerido, a atividade principal será
aquela com salários-de-contribuição economicamente mais vantajosos, na
linha do entendimento uniformizado no âmbito desta TNU (Pedilef
5001611-95.2013.4.04.7113).(...)" - destaques acrescentados
Os
demais parâmetros atinentes ao cálculo da RMI, tais como a forma de concessão
da aposentadoria, a metodologia de apuração do salário-de-benefício e os
salários-de-contribuição das competências incontroversas manter-se-ão na forma
do cálculo previsto na legislação.
FONTE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5017575-08.2015.4.04.7001/PR
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