É possível conceder salário-maternidade ou
licença-maternidade ao pai que ficou viúvo logo após o parto que, tragicamente,
resultou na morte da mãe do seu filho recém-nascido?
Numa interpretação literal da lei, isso não seria
admissível, porque os benefícios seriam assegurados apenas à mãe (mulher).
Felizmente, a moderna jurisprudência caminhou para interpretar a norma dentro
de um contexto constitucional e acompanhando a evolução social que traz novas
atribuições ao sexo masculino e respeita o direito dos homossexuais.
O salário-maternidade tem por
finalidade proteger o bebê que acabou de nascer, para que ele tenha toda a
atenção, carinho, segurança e dedicação integral da sua mãe, sem abalar a situação
financeira da família. Ora, se a mãe faleceu no período da gestação e não pode,
obviamente, cumprir aquela função de convivência e desvelo familiar, afigura-se
muito justo que o pai substitua a mãe nessa atividade e, por isso mesmo, tenha
o amparo previdenciário para bem desempenhá-la.
O art. 227 da Constituição
Federal estabelece que:
“Art. 227. É dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e
à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação
dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)”
Somam-se, ainda, os princípios da
dignidade humana (o pai e a criança que foram dolorosamente privados da mãe
devem ter o apoio necessário da sociedade para seguir a vida com menos
sofrimento), da proteção à infância, da proteção à família e da isonomia
(igualdade dos sexos).
Nesta toada, a 2a.
Turma Recursal do Paraná, sendo relator o juiz federal Leonardo Castanho
Mendes, assim decidiu:
SALÁRIO-MATERNIDADE. REQUERENTE O
PAI VIÚVO. ART. 71 DA LEI 8.213/91. INTERPRETAÇÃO AMPLIATIVA.
Conquanto mencione o art. 71 da
Lei 8.213/91 que o salário-maternidade é destinado apenas à segurada, situações
excepcionais, como aquela em que o pai, viúvo, é o responsável pelos cuidados
com a criança em seus primeiros meses de vida, autorizam a interpretação
ampliativa do mencionado dispositivo, a fim de que se conceda também ao pai o
salário-maternidade, como forma de cumprir a garantia constitucional de
proteção à vida da criança, prevista no art. 227 da Constituição Federal de
1988.
Recurso do autor provido.
(RECURSO CÍVEL Nº 5002217-94.2011.404.7016/PR, por maioria, julgado em
28/02/2012).
Nesse caso concreto, a notícia
veiculada para a imprensa informava que o pai, trabalhador pelo regime da CLT e
segurado pelo RGPS, residente em Toledo-PR, não conseguiu a licença-maternidade
junto ao INSS e recorreu à Justiça Federal em primeiro grau que também denegou
o pedido. Dessa forma, o pai tirou uma licença não remunerada com a
aquiescência do empregador para cuidar do bebê. Recorreu da decisão e pediu o
pagamento do salário-maternidade correspondente, obtendo êxito na 2a.
Turma Recursal do Paraná, para se ver ressarcido pelos quatro meses que ficou sem o salário normal.
Num segundo caso concreto, houve a concessão de liminar em mandado de segurança em favor de um servidor público da
Polícia Federal de Brasília-DF, o qual ficou viúvo poucos dias depois do nascimento de seu filho, em que a juíza federal Ivani Silva da Luz (6a.
Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, Processo
6965-91.2012.4.01.3400, data do julgamento: 08/02/2012), destacou que:
“Embora não exista previsão legal
e constitucional de licença paternidade nos moldes da licença maternidade,
estão não deve ser negada ao genitor, ora Impetrante. Isto porque o fundamento
deste direito é proporcionar à mãe período de tempo integral com a criança,
possibilitando que sejam dispensados a ela todos os cuidados essenciais a sua
sobrevivência e ao seu desenvolvimento.
Na ausência da genitora, tais
cuidados devem ser prestados pelo pai e isto deve ser assegurado pelo Estado,
principalmente, nos casos como o presente, em que, além de todas as necessidades
que um recém-nascido demanda, ainda há a dor decorrente da perda daquela.
Nestas circunstâncias, os
princípios da dignidade humana e da proteção à infância devem preponderar sobre
o da legalidade estrita, que concede tão somente às mulheres o direito de gozo
da licença maternidade”.
Logo, o servidor público obteve,
em sede liminar, o direito de gozar a licença-paternidade nos mesmos moldes da
licença-maternidade.
Entendemos que as decisões
judiciais acima citadas merecem todos os aplausos da sociedade brasileira e
devem inspirar a jurisprudência, pois fazem valer o direito do recém-nascido
(com absoluta prioridade, nos termos da CF) de ter uma pessoa dedicada a ele em
tempo integral na fase em que é mais carente e dependente do amor e dos
cuidados do seu genitor e, ainda, suporta a dor da perda de sua mãe.
Os autores
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